Capitais do Centro-Oeste, Sul e Sudeste gastaram mais com saúde em 2023; Rio de Janeiro é exceção, mostra o Boletim IEPS Data n. 4
Centro Municipal de Saúde Manoel José Ferreira, no Rio de Janeiro. Foto: Divulgação/Agência Brasil
Centro Municipal de Saúde Manoel José Ferreira, no Rio de Janeiro. Foto: Divulgação/Agência Brasil
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As capitais do Centro-Oeste, Sul e Sudeste foram as que mais gastaram com saúde em 2023. Quase todas as capitais dessas regiões estão entre as 15 primeiras colocadas no ranking de despesas per capita com saúde apresentado no Boletim IEPS Data n. 4 – Saúde nas Capitais. A única exceção é o Rio de Janeiro (RJ) que ocupa a 17ª posição.  O ranking faz parte do bloco “Gastos Municipais”, que considera dois indicadores: despesa total com saúde sob responsabilidade do município e despesa total com saúde, inclusive as financiadas por outras esferas de governo. 

O estudo é uma produção do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) elaborada a partir de informações disponíveis no IEPS Data, um portal de dados que reúne mais de 180 indicadores de saúde de todos os municípios brasileiros entre 2010 e 2023.  Em síntese, o estudo analisou 7 indicadores disponíveis no Panorama de Saúde Local do IEPS Data, que foram organizados em blocos: “Gastos Municipais”,  “Mortalidade e Morbidade” e “Atenção Básica”.  Além da análise do valor de cada indicador, os rankings apresentados na pesquisa consideraram uma padronização dos indicadores. Dessa forma, os indicadores foram considerados a partir de uma a mesma polaridade, o que possibilitou a construção adequada do ranking.

Capitais do Centro-Oeste, Sul e Sudeste gastaram mais com saúde em 2023; Rio de Janeiro é exceção, mostra o Boletim IEPS Data n. 4

Posição dos Municípios segundo indicadores do Panorama de Saúde Local (2023). Fonte: Boletim IEPS Data n. 4 – Saúde nas Capitais.

Helena Arruda, pesquisadora do IEPS e uma das autoras do estudo, explica que a análise observou o valor absoluto de cada indicador e a posição relativa dos municípios no ano de 2023 para cada um deles. 

“O gradiente de cores demarca a posição da capital no ranking, sendo o roxo escuro a representação das posições mais altas e o amarelo claro as posições mais baixas. Além disso, o processo de padronização dos indicadores possibilitou a construção da coluna “Total” que mostra o ranking das capitais em cada dimensão discutida. Essa análise permite resumir a posição relativa dos municípios por bloco e realizar um diagnóstico de sua situação”, explica Arruda.

Capitais do Norte e Nordeste apresentam os menores gastos com Saúde; Teresina e Natal são exceções

Nas últimas posições do ranking “Gastos Municipais” estão as capitais do Norte e Nordeste, com exceção de Teresina (PI) e Natal (RN), que ocupam a 4ª e 7ª posição, respectivamente. O ranking “Gastos Municipais” considera tanto as despesas em saúde utilizando recursos próprios do município quanto as despesas totais, que consideram também as despesas financiadas por outras esferas de governo.

O boletim também analisou a evolução da despesa total em saúde per capita nas capitais brasileiras entre 2010 e 2023. Nesse caso, foi considerado apenas esse indicador em razão da relevância dos recursos provenientes de outros níveis de governo na composição dos gastos com atenção primária em saúde. O estudo identificou que houve um aumento de gastos em todas as capitais, com exceção de Aracaju (SE). A análise por região do país mostra que as capitais com os maiores aumentos nas despesas foram Natal (Nordeste), Cuiabá (Centro-Oeste), Belo Horizonte (Sudeste), Porto Alegre (Sul) e Rio Branco (Norte). 

Nesse contexto, é importante destacar que a comparação se baseia em valores totais por habitante, o que ajuda a mitigar as possíveis desigualdades na capacidade de arrecadação dos municípios. Outro ponto destacado no levantamento é que os aumentos podem ser explicados, em partes, por alterações no regime legal de transferências e gastos em saúde, como a introdução da Lei Complementar 141 de 2012.

Morbidade e mortalidade 

No ranking  “Mortalidade e Morbidade”, composto pelos indicadores “Mortalidade Ajustada por Causas Evitáveis” e “Hospitalizações por Condições Sensíveis à Atenção Primária”, as capitais da região Norte do país ocuparam as piores posições, com exceção de Palmas (TO) que ficou em 1º lugar, apresentando a taxa mais baixa de morbidade e mortalidade do país. As demais capitais da região ficaram entre as 10 posições mais baixas do ranking. O final do ranking conta ainda com  Porto Alegre, única capital do Sul do país a aparecer nas últimas posições, ocupando o 23º da lista. As demais capitais do Sul, Florianópolis e Curitiba ficaram em 2º e 5º lugar, respectivamente.

Na análise da evolução ao longo do tempo, o boletim analisou as taxas de mortalidade ajustada para causas evitáveis entre 2010 e 2023 e os resultados apresentaram variação de acordo com a região do país. Sul, Sudeste e Centro-Oeste apresentaram redução nas taxas de mortalidade, enquanto nas capitais do Norte e Nordeste houve aumento.

Os destaques negativos ficaram com Boa Vista que passou de 89,5 para 137 óbitos por 100.000 habitantes, Macapá que foi de 89,6 para 126,8 óbitos por 100.000 habitantes e Rio Branco que registrou um aumento de 93,3 para 117,6 óbitos por 100.000 habitantes no período. Já as capitais que registraram melhora no indicador foram Aracaju, que passou de 98,2 para 78 óbitos por 100.000 habitantes, Palmas que registrou uma redução de 88,8 para 70,3 óbitos por 100.000 habitantes e Porto Velho que foi de 128,4 para 111,1 óbitos por 100.000 habitantes. 

Aumento de despesas e taxas de mortalidade

Um dos aspectos enfatizados na pesquisa é que a melhoria nos índices de mortalidade ajustada por causas evitáveis não está relacionada necessariamente ao aumento dos gastos per capita do município com saúde. Aracaju, por exemplo, foi a capital com maior queda de mortalidade ao mesmo tempo em que foi a única em que não foram observados aumentos reais na despesa total com saúde. 

Ao analisar os 5.570 municípios brasileiros, o boletim identificou uma correlação fraca de -0.07 entre o aumento de despesas e a redução da mortalidade ajustada por causas evitáveis. Por outro lado, analisando apenas as capitais há uma correlação negativa moderada (-0.35) entre os indicadores, o que significa que uma maior despesa total em saúde per capita está associada a uma menor mortalidade ajustada por causas evitáveis.

O estudo destaca que a relação entre os indicadores não é necessariamente de causalidade, mas que são informações úteis para avaliar possíveis associações entre os indicadores e para investigar padrões regionais na saúde. Além disso, outros fatores podem estar relacionados ao aumento ou queda nas taxas de mortalidade.

Atenção Básica

O boletim também reuniu 3 indicadores para analisar a Atenção Básica nas capitais em 2023: cobertura vacinal de poliomielite, cobertura da atenção básica e percentual de nascidos vivos com 7 ou mais consultas de pré-natal. Nesse quesito, as capitais nordestinas aparecem nas posições mais baixas do ranking. Entre os últimos 5 colocados estão Salvador (22ª posição), Maceió (24ª posição) e São Luís (25º). Macapá (23ª) e Belém (27ª), ambas da região Norte, ocupam as demais posições. 

Um aspecto importante destacado pelo boletim é que não há necessariamente uniformidade entre os indicadores que integram cada bloco, em especial no bloco Atenção Básica. Nesse caso, Boa Vista e Macapá são exemplos interessantes. Ambas as cidades apresentaram 100% de cobertura de atenção básica, mas tiveram apenas 49,7% e 59,1% de nascidos vivos com 7 ou mais consultas pré-natal, respectivamente. 

“Esses exemplos indicam que mesmo locais com uma cobertura grande, podem precisar desenvolver ações para aumentar a efetividade dos serviços da Atenção Básica. Dessa forma, esses dados podem contribuir para que os governos definam prioridades e metas focando em áreas de menor desempenho, mesmo em capitais que apresentam bons resultados para um bloco de indicadores”, explica Vinícius Peçanha, pesquisador do IEPS e também um dos autores da pesquisa.