A articulação intersetorial, a efetivação de direitos sociais e da cidadania e a importância de pensar saúde mental para além dos transtornos e da medicalização foram alguns dos consensos entre os especialistas que participaram do webinário “Saúde Mental dos Professores”, realizado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e pelo Juntô – Iniciativa Brasileira de Saúde Mental de Crianças e Adolescentes, na última sexta-feira (10). O encontro foi transmitido no canal do IEPS no Youtube.
O webinário foi a primeira aula aberta do curso “Da Lei à Prática: Como Implementar a Política Nacional de Saúde Mental nas Escolas”, organizado pela Secretaria de Educação de Pernambuco (SEE-PE) com o objetivo de formar os profissionais dos Núcleos de Atenção Psicossocial nas Escolas (NAPSES) e do Comitê Intersetorial do Sistema Estadual de Atenção Psicossocial nas Escolas do estado de Pernambuco.
O encontro reuniu quase 80 profissionais de forma simultânea e foi um espaço de discussão sobre as principais causas de adoecimento dos profissionais de saúde, o cenário da saúde mental nas comunidades escolares e as possibilidades de construção de espaços mais seguros e políticas públicas mais efetivas para o cuidado nas escolas.
Saúde mental envolve cidadania e acesso a políticas públicas
Lilian Souza, professora da graduação e pós-graduação em Serviço Social na UFRJ, abriu sua fala destacando que a saúde é muito mais que a ausência de doença, pois diz respeito à efetivação da cidadania e ao acesso à diversas políticas públicas. Para ela, a promoção da saúde mental nos ambientes escolares deve considerar as dimensões políticas e sociais do adoecimento docente, que está relacionado à precarização dos trabalhadores, fragmentação da classe, baixa representatividade de determinados grupos sociais e desigualdades socioeconômicas e socioeducacionais.
A compreensão das especificidades do ofício docente são, para ela, um caminho importante para promover políticas de cuidado nas escolas. “Nosso trabalho está mediado por condições materiais, pelo espaço físico da sala de aula. Essas condições materiais institucionais pautam o trabalho e minha autonomia sempre será relativa, e não absoluta. A instituição interfere no nosso trabalho porque dita as condições de como vamos trabalhar. É importante não perder isso de vista”, afirma.
Construção comunitária na escola e promoção da saúde
A importância do território e das dinâmicas da comunidade em que tanto a escola quanto os profissionais estão inseridos também foi destacada por Raquel Guzzo, professora da PUC-Minas e conselheira do XIX Plenário do Conselho Federal de Psicologia. Guzzo reforçou que soluções coletivas, baseadas na construção comunitária dentro do ambiente escolar são essenciais para promover a saúde.
“Quando a gente compreende o contexto onde a escola está inserida, a vida cotidiana, os desafios enfrentados pelos professores e estudantes, a gente consegue desenvolver a possibilidade de um trabalho muito mais eficaz do que se a gente estivesse a distância, numa clínica escola, hospital ou universidade, levando os problemas da escola para serem interpretados, analisados e tratados nesses espaços”, afirmou.
A especialista defendeu que o esgotamento emocional afeta a identidade e o bem-estar dos educadores, o que impacta diretamente o cotidiano da escola. Para ela, as soluções coletivas no território permitem uma compreensão desse esgotamento para além da lógica médica e psiquiátrica do sofrimento, dando um sentido coletivo para a efetivação da saúde. “Precisamos olhar, identificar e prevenir que esses problemas aconteçam. Não é só atribuir a um sujeito específico essa questão, mas sim à escola como um todo, como um organismo de conhecimento”, diz.
Intersetorialidade
É no coletivo e na intersetorialidade que José Junior, do Núcleo de Atenção ao Servidor (NAS) de Pernambuco, aponta os caminhos para a promoção da saúde mental docente. Junior apresentou o trabalho dos NAS, que presta serviços de assistência, prevenção e promoção da saúde, buscando trabalhar desafios emocionais e psíquicos dos profissionais. Para ele, a articulação intersetorial é essencial para ampliar o cuidado aos servidores da educação, induzindo uma construção de respostas que perpassam áreas como a saúde, assistência social e psicologia, capazes de captar o real das demandas do território.
Papel social da escola e protagonismo juvenil serão os próximos temas de debate
A programação do curso inclui ainda mais duas aulas abertas com transmissão ao vivo no canal do IEPS no YouTube. O próximo webinário, marcado para o dia 7 de novembro, às 10h, irá abordar “O papel social da escola na promoção de saúde mental” e o último, com o tema “A importância do protagonismo juvenil nas políticas públicas de saúde mental”, ocorre no dia 28 de novembro, também às 10h.
O curso é promovido pela Unidade de Atenção Psicossocial às Escolas (UAPSE), por meio do Projeto EntreLaços, em parceria com o Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e o Juntô – uma iniciativa do Global Center da Fundação Stavros Niarchos (SNF) para a saúde mental de crianças e adolescentes no Child Mind Institute (CMI), e com o apoio do Ministério da Educação (MEC). A iniciativa é um dos desdobramentos do Acordo de Cooperação Técnica assinado em 2024 entre a SEE-PE e o IEPS.