Entre 2013 e 2023, o uso de medicamentos antipsicóticos cresceu mais de 50%, passando de 29 milhões para 44,6 milhões de registros, e o número de atendimentos psicossociais no SUS dobrou, passando de 13,1 milhões para 26,4 milhões. Os dados revelam o aumento da demanda por cuidados em saúde mental na última década e fazem parte do Boletim Radar Mais SUS n. 2 – A oferta e distribuição de serviços de saúde mental no Brasil entre 2013 e 2023, elaborado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), em parceria com a Umane. A pesquisa faz parte das iniciativas da Agenda Mais SUS, um projeto criado para contribuir com o fortalecimento das políticas de saúde no Brasil a partir de propostas concretas para o SUS.
Ainda de acordo com o boletim, considerando toda a Produção Ambulatorial do SUS, que envolve procedimentos como atendimentos, medicalização, procedimentos e diagnósticos, foram 75,7 milhões de registros no Sistema de Informação Ambulatorial do SUS (SIA/SUS). Segundo Dayana Rosa, gerente de programa do IEPS e especialista em saúde mental e uma das autoras da pesquisa, os números podem refletir a piora na saúde mental da população brasileira ocorrida nos últimos anos.
“Esse aumento de atendimentos e medicalização pode estar associado a um contexto de piora da saúde mental da população, refletindo também um aumento da conscientização sobre a importância da busca pelo cuidado. Os desafios para a saúde mental cresceram, em especial entre os jovens, e mudaram muito desde o contexto da Reforma Psiquiátrica. Estamos falando de um fenômeno complexo e rápido, que pode estar acompanhado também de outros processos, como a banalização do tema ou patologização da vida”, pontua Dayana Rosa.
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Utilização de psicoterapia no SUS entre 2013 a 2023. Fonte: Boletim Radar Mais SUS n. 2 – A oferta e distribuição de serviços de saúde mental no Brasil entre 2013 e 2023 com dados do Sistema de Informações Ambulatoriais do SUS (SIA/SUS).
Queda no número de leitos psiquiátricos no SUS e crescimento no setor privado; número de CAPS cresceu 42,7%
O Boletim Radar Mais SUS n. 2 aponta também uma queda de 53,7% no número de leitos psiquiátricos no SUS no período analisado, que passou de 33.454 leitos para 16.326. Já o número de Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) cresceu, registrando um aumento de 42,7%, o que em números absolutos significa uma expansão de 2.224 estabelecimentos em 2013 para 3.343 em 2023 – com crescimento mais lento a partir de 2017.
“O aumento da oferta de CAPS e a redução de leitos psiquiátricos no SUS são índicios importantes de que nos últimos anos, no sistema público, o modelo de atenção psicossocial vem superando o modelo asilar. Isso também é verificado nas atualizações normativas dos primeiros anos do atual Governo Lula e na criação de um departamento de saúde mental, dentro do Ministério da Saúde”, comenta Rosa.
Ela salienta ainda que, apesar da retomada da Reforma Psiquiátrica, é importante lembrar a permanência do modelo asilar nas ações do Governo Federal, com o incentivo, por exemplo, às Comunidades Terapêuticas e ao setor privado da saúde, que registrou um aumento de leitos psiquiátricos.
No setor privado, houve um crescimento de 18,7% no número de leitos psiquiátricos, que passou de 10,0 mil para 12,5 mil leitos no período analisado. O crescimento foi expressivo em Pernambuco, Bahia, Ceará, Acre, Goiás, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Pará, onde a razão de leitos por habitante cresceu acima de 70%.
Distribuição de leitos psiquiátricos privados e públicos nos estados
Na análise da distribuição regional dos leitos psiquiátricos no setor privado, o Distrito Federal destoa dos demais estados pela alta oferta de leitos psiquiátricos privados tanto em 2013 quanto em 2023 (19,6 e 17,5 por 100 mil habitantes, respectivamente). No último ano da análise, após um crescimento de 91,2%, Goiás alcançou o segundo lugar entre os estados com o maior número de leitos privados, registrando o mesmo nível do Distrito Federal e alcançando 17,5 leitos psiquiátricos privados por 100 mil habitantes.
O Rio Grande do Sul aparece em terceiro lugar com 11,7 leitos. O estado fica entre aqueles com maior número de leitos psiquiátricos públicos e privados do país.
Já em relação aos leitos psiquiátricos no SUS, Rondônia e Distrito Federal apresentaram crescimento de 96% e 57%, o que representa 5,5 e 5,0 leitos por 100 mil habitantes, respectivamente, enquanto o Amapá registrou um aumento de 26%, o que, por sua vez, representa 2,6 leitos por 100 mil habitantes. Apesar do aumento, essas unidades federativas (UF) continuam abaixo da média nacional de 8,0 leitos por 100 mil habitantes. Nas demais UF foi identificado uma redução de leitos.
O estudo também aponta que, em 2023, Rio Grande do Sul e Paraná foram os estados com maior oferta de leitos psiquiátricos SUS, registrando 16,9 e 16,1 por 100 mil habitantes, respectivamente.
Cresce número de profissionais com nível superior nos CAPS
O número de profissionais de nível superior cresceu 66,8% nos CAPS, passando de 8,2 profissionais por 100 mil habitantes para 13,6 entre 2013 e 2023. Os CAPS são compostos por equipes multidisciplinares que precisam ter no mínimo, segundo a Portaria n. 336/2022:
- 01 médico ou médica com formação em saúde mental
- 01 enfermeiro ou enfermeira
- 03 profissionais de nível superior, como psicólogo ou psicóloga, assistente social, terapeuta ocupacional, pedagogo ou outro profissional necessário ao projeto terapêutico
- 04 profissionais de nível médio, como técnico e/ou auxiliar de enfermagem, técnico administrativo, técnico educacional e artesão
O boletim mostrou que o número de profissionais de enfermagem foi o que mais cresceu, saltando de 3,6 mil para 7,9 mil no período. Em relação aos demais profissionais, o crescimento alcançou índices similares. A disponibilidade de assistentes sociais, profissionais de psiquiatria e de psicologia atuando nos CAPS cresceu 67%, 66% e 59%, respectivamente.