O Previne Brasil, modelo de financiamento da Atenção Primária à Saúde (APS) implementado desde 2020, redistribuiu recursos entre os municípios em um cenário de não crescimento no financiamento regular da atenção primária no Sistema Único de Saúde (SUS). O diagnóstico foi apresentado no Estudo Institucional n. 9: Previne Brasil: Análise da distribuição dos recursos e diagnóstico de resultados, elaborado pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS). O estudo na íntegra pode ser acessado aqui.
O Previne Brasil substituiu o Piso da Atenção Básica (PAB), modelo de distribuições de recursos que vigorava desde 1997, e implementou novos critérios de financiamento. A mudança é substancial. Diferente do PAB, que transferia recursos de acordo com a população total do município, o Previne Brasil considera o número de pessoas cadastradas nas Unidades Básicas de Saúde (UBS), a chamada “captação ponderada”. Nesse modelo, cada cadastrado tem um peso diferente, que aumenta caso o usuário seja beneficiário de programas de assistência social, como Bolsa Família e BPC, e caso se trate de crianças, idosos e pessoas residentes em áreas remotas ou rurais. Os números do programa, indicam que os cadastros evoluíram rapidamente entre 2020 e 2022.
Outra diferença importante é o pagamento por desempenho. O Previne estabelece pagamentos por desempenho em procedimentos específicos como, por exemplo, consultas pré-natais e cobertura citopatológica, enquanto o PAB considerava os resultados de avaliação no Programa de Melhoria da Qualidade da Atenção Básica.
O estudo constatou que, em outubro de 2022, os municípios brasileiros, sejam remotos, rurais ou urbanos, estão com desempenho abaixo da meta estabelecida para a maior parte dos indicadores definidos pelo Previne. Os indicadores relacionados à pré-natal são os únicos que a maioria dos municípios alcançam as metas.
Recursos para a APS se mantiveram estáveis na transição dos modelos de financiamento
Apesar do crescimento no orçamento total para a Atenção Primária entre 2016 e 2022, a alteração no modelo de financiamento não foi acompanhada por um aumento no orçamento para o Previne Brasil. Os valores destinados ao custeio regular da APS apresentaram estabilidade no período de 2016 a 2022, com um aumento de apenas 10%. O estudo identifica uma priorização de financiamento para custeios temporários, mais especificamente para as emendas parlamentares.
Segundo Leonardo Rosa, pesquisador do IEPS e um dos autores da pesquisa, o custeio temporário pode gerar desafios para os municípios, já que se trata de recursos sem previsibilidade. “A flutuação no volume de recursos pode ser grande e gerar problemas de coordenação para que os municípios ofereçam serviços de saúde de forma estável”, explicou.
Mudança promove redistribuição dos recursos entre os municípios brasileiros
Uma alteração importante gerada pela mudança de modelo foi a redistribuição de recursos entre os municípios. O Previne Brasil estabeleceu novas regras de financiamento que beneficiaram municípios rurais, remotos e com maior número de beneficiários de programas sociais, idosos, crianças e equipes na Atenção Primária. Com as novas regras, os municípios urbanos, com maior densidade populacional e com áreas mais ricas tiveram queda no orçamento da APS.
“A distribuição de recursos com foco nos que mais precisam ou têm maiores dificuldades em acessar os serviços básicos de saúde é positiva. No entanto, o aumento no total de recursos parece ter sido insuficiente para que alguns locais, por exemplo, os mais populosos, não fossem penalizados. Os princípios de distribuição do programa parecem corretos, mas há espaço para melhoria.”, explica Leonardo Rosa.
Nos municípios rurais, o novo modelo estimulou significativamente o cadastramento de novos usuários, já que o registro da população é um dos fatores que determinam o financiamento. Cadastros de qualidade (avaliação que só pode ser feita pelo Ministério da Saúde) geram informações relevantes para o planejamento, monitoramento e avaliação das ações da APS.
Nova dinâmica de distribuição de recursos entre as Ações Estratégicas
O financiamento dos programas que integram as Ações Estratégicas também sofreu alterações relevantes com a mudança do PAB para o Previne. Os Agentes Comunitários de Saúde (ACS), por exemplo, receberam um aumento substancial entre 2018 e 2022, passando de 42% para 69% no recebimento de recursos regulares. Já os recursos para o Núcleos de Apoio à Saúde da Família (NASF) foram eliminados e direcionados para outras ações, como o programa Saúde na Hora.
“Os resultados que encontramos sugerem que as mudanças legais relativas ao piso salarial de agentes comunitários diminuíram o espaço para outras ações estratégicas do Ministério da Saúde. Nossa análise indica que a extinção do NASF, por exemplo, se deve muito mais à necessidade de direcionar recursos para o aumento do custeio de ACS e novas ações do ministério da saúde (por exemplo, Saúde na Hora) do que pelas mudanças centrais dos componentes do Previne (captação ponderada e pagamento por desempenho)”, afirma Rosa.
Estudo Institucional n. 9: Previne Brasil: Análise da distribuição dos recursos e diagnóstico de resultados
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