Os recentes ataques em escolas no Brasil deixaram a sociedade em alerta. De acordo com levantamento do Instituto Sou da Paz, conflitos armados em escolas vitimaram 93 pessoas nas últimas duas décadas. Os dados mostram que o fenômeno tem se agravado nos últimos anos. Enquanto nos governos Lula e Dilma, entre 2002 e 2016, foram 14 mortes registradas. No governo Bolsonaro, em quatro anos, foram 16 mortes. O instituto aponta o aumento do incentivo a violência como um dos fatores para este cenário.
As informações foram trazidas por Dayana Rosa, especialista em relações institucionais do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS), durante o Diálogos IEPS #11 realizado nesta segunda-feira (24/04). “É difícil falar de saúde mental nas escolas sem lembrar de ataques armados. Ações isoladas não vão resolver esse problema. Vão apenas apagar incêndio. O problema exige respostas articuladas”, disse a pesquisadora em Saúde Mental. “Promover Saúde Mental na comunidade escolar é proteger estudantes, professores, profissionais da escola, famílias. Saúde Mental é uma solução coletiva”, completou.
A cartilha “10 ações para políticas de Saúde Mental nas escolas” também foi pauta do debate. Bruno Ziller, coordenador de projetos do Instituto Cactus, apresentou evidências que demonstram que políticas de Saúde Mental podem ser aliadas do desenvolvimento socioeconômico do país. Ele também deu detalhes sobre a cartilha, elaborada em parceria entre IEPS e Cactus. Em março, o documento foi entregue a membros do Executivo e Legislativo, contendo recomendações de ações práticas para enfrentar o problema.
“Temos que pensar também sobre os determinantes sociais, pobreza, discriminação, pandemia. Aqui há uma janela de oportunidade. Os dados mostram que a maioria das questões em saúde mental não são biológicas”. Ou seja, segundo ele, promover políticas que gerem qualidade de vida é uma forma de enfrentar os agravos que a população tem vivido.
Frente Parlamentar de Promoção da Saúde Mental
“O Brasil é o país mais violento contra professores do mundo”, destacou a deputada federal Tábata Amaral (PSB-SP), que convidou os representantes da sociedade civil e a população como um todo a participar das ações que tem encabeçado no Congresso Nacional, em prol da promoção da Saúde Mental no Brasil. Uma das iniciativas que terão apoio do IEPS e Instituto Cactus é a criação da Frente Parlamentar de Promoção da Saúde Mental, prevista para este ano.
“Esse não é um problema de segurança pública. É muito mais complexo. Precisamos de uma frente de promoção da saúde mental, que tem que ser pensada com base no que diz a ciência para que a gente possa promover uma sociedade que realmente acolha”, completou a parlamentar, autora do Projeto de Lei (PL) n. 3.408/2021, que visa instituir a Política Nacional de Atenção Psicossocial nas Comunidades Escolares. O IEPS contribuiu tecnicamente com o projeto.
Cenário preocupante
A cartilha destaca o monitoramento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), publicado em 2019, que mostrou a automutilação e o suicídio entre as principais causas de mortalidade, que totalizam mais de 67 mil mortes anuais, estando os transtornos depressivos, de ansiedade e problemas comportamentais entre os maiores contribuintes para a carga de doença entre os jovens.
Em 2013, a taxa de prevalência de transtornos mentais entre crianças e adolescentes estava entre 10,8% e 12,7%. Depois da pandemia, esse cenário piorou drasticamente. Dados divulgados pela Unicef em 2021 mostram que 56% dos adultos reportaram que um adolescente de seu domicílio apresentou um ou mais sintomas relacionados à saúde mental durante o isolamento social, incluindo: mudanças repentinas de humor e irritabilidade (29%) e até mesmo alterações no apetite (25%).
É preciso ouvir a juventude
Morador da periferia da zona sul de São Paulo, a fala do educador da Plan International Brasil, Julio (por motivos de segurança, o sobrenome não será revelado), 17 anos, trouxe para o debate a visão de quem sente na pele a complexidade que envolve as questões da saúde mental dos adolescentes. Ele abordou vários aspectos que fizeram com que a ansiedade, o medo e a defasagem escolar passassem a fazer parte do seu dia a dia, especialmente, no pós-pandemia. “Na volta às aulas, tive ansiedade e desconforto – foi uma experiência horrível. Estamos indo pra escola com medo de ataques. Nunca imaginei que eu iria viver isso”, frisou.
Já a coordenadora de Projetos da Plan International Brasil, Angélica Duarte, destacou os resultados de uma pesquisa qualitativa realizada pela entidade com adolescentes de três países: Brasil, Quênia e Índia. Entre os principais achados da pesquisa, Angelica destacou as questões externas e de gênero como pobreza, assédio e violência sexual, entre as que mais afetam a saúde mental dos adolescentes brasileiros. “Saúde não é ausência de doença, é bem estar físico, mental e social. Combate ao racismo, promoção da igualdade de gênero, isso tb tem a ver como promoção de saúde”, completou