Mais de 70% dos brasileiros com depressão não receberam nenhum tratamento em 2019, aponta estudo
Centro de Atenção Psicossocial II de Taguatinga. Foto: Tony Winston/Agência Brasília.
Centro de Atenção Psicossocial II de Taguatinga. Foto: Tony Winston/Agência Brasília.

Um ano antes da pandemia de Covid-19, mais de 70% dos brasileiros com depressão não receberam nenhum tratamento contra a doença, segundo estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) publicado no periódico internacional SSM – Population Health. A pesquisa utilizou dados de 2013 e 2019 da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) e também apontou que a falta de tratamento é maior entre pessoas negras. 

A maior lacuna no tratamento da depressão entre pessoas negras está relacionada ao lugar de moradia, como explica Matías Mrejen, pesquisador do IEPS e um dos autores do estudo. “Há uma relação entre as desigualdades raciais e as regionais no acesso aos tratamentos de saúde mental. As regiões do país onde a população negra é predominante são as regiões onde as lacunas de tratamento também são maiores. Tudo indica que a distribuição desigual de serviços de atenção à saúde mental e de profissionais no território brasileiro provavelmente esteja por trás disso”, enfatiza Mrejen.
 
Dados apresentados na pesquisa mostram que um número menor de profissionais de saúde mental nas regiões brasileiras com maior número de pessoas negras. Na região Sul, por exemplo, onde 72,4% dos indivíduos se identificam como brancos, existem 48 psicólogos e psiquiatras por 100.000 habitantes. Já na região Norte e Nordeste do país, a situação é bem diferente. Nessas regiões, nas quais apenas 18,5% e 24,6% da população, respectivamente, se autodeclaram brancos, a oferta de profissionais de saúde mental é de 17,6 e 24,8, respectivamente, por 100.000 habitantes. 

Mais de 70% dos brasileiros com depressão não receberam nenhum tratamento em 2019, aponta estudo
O estudo aponta as desigualdades socioeconômicas e raciais na prevalência de depressão e nas lacuna de tratamento da doença no Brasil entre 2013–2019.

População pobre tem mais chances de desenvolver depressão

A maior prevalência da doença entre pessoas de baixa renda está associada a fatores como emprego, exposição à violência e a prática de atividades físicas. Dados de 2019, mostram uma diferença de 56% na incidência de depressão entre as pessoas de renda mais alta e mais baixa. Apesar dessas diferenças de renda, o estudo enfatiza que, no Brasil, o tratamento da depressão é um desafio que atinge todas as posições socioeconômicas. Mrejen destaca que, apesar da pesquisa ser focada em mapear as desigualdades, existem algumas hipóteses para entender as causas para o baixo índice de tratamento da doença. 

“Uma comparação internacional mostra que o Brasil tem poucos profissionais de saúde mental, principalmente psiquiatras, em relação ao tamanho da população. Dados da Organização Mundial da Saúde, por exemplo, mostram que o número de psiquiatras trabalhando em atenção à saúde mental no Brasil, em proporção ao tamanho da população, é menos do que a metade do que no Chile e menos do que um quarto do que no Uruguai. E a situação é ainda pior se comparado com países de alta renda”, explica o pesquisador do IEPS, que enfatiza ainda a distribuição desigual desses profissionais no território brasileiro, como foi identificado na pesquisa.