A Cátedra Çarê-IEPS é um projeto do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde e do Instituto Çarê criado com o objetivo de produzir pesquisas e informações qualificadas sobre a saúde da população negra (SPN) no Brasil. A SPN é um campo de estudos que têm se desenvolvido e que busca compreender os fatores associados às desigualdades raciais para embasar políticas públicas de promoção de condições de saúde mais igualitárias. A formação de pesquisadores e pesquisadoras negras em pesquisas sociais aplicadas e o apoio aos projetos sociais desenvolvidos pelo Instituto Çarê e pelo Instituto Acaia também estão no horizonte da parceria Çarê-IEPS.
Iniciadas em janeiro de 2022, as atividades da cátedra envolvem a produção de relatórios, pesquisas, boletins e artigos de opinião sobre saúde e questões raciais, dentre outras iniciativas. São incentivadas também parcerias com outras instituições que se dedicam ao debate sobre raça e saúde.
O campo de estudos sobre saúde da população negra: o que já foi produzido nas ciências da saúde pública e coletiva no Brasil?
Uma das atividades realizadas no primeiro ano da Cátedra Çarê-IEPS foi o levantamento da produção científica e acadêmica sobre saúde com o recorte racial. A pesquisa utilizou o método de revisão sistemática integrativa, que sintetiza o conhecimento já produzido sobre determinado tema, associado a técnicas de análise bibliométrica. O objetivo foi mapear o campo de estudos sobre a SPN com o objetivo de reduzir as lacunas do conhecimento científico sobre o tema no Brasil.
O levantamento baseou-se na estratégia PICo, que delimita o recorte “População”, “Interesse” e “Contexto” como norteadores e utilizou o protocolo PRIMAS para orientar os critérios de seleção, inclusão e exclusão de temas. A pesquisa utilizou “Saúde da População Negra” como palavra-chave e três descritores do DeCs/Mesh:
- Saúde das Minorias e Saúde das Minorias Étnicas
- Grupo com Ancestrais do Continente Africano
- Racismo
Os pesquisadores consultaram os portais BVS, Pubmed e o Catálogo de Teses e Dissertações da CAPES, identificando 1.686 estudos e selecionando 400 trabalhados entre 1998 e 2020. A análise indica que, embora os estudos sobre a saúde da população negra ainda sejam incipientes no Brasil, é possível observar o desenvolvimento deste “campo de reflexão” ao longo das três últimas décadas. Também constatou-se um maior volume de pesquisas nos últimos anos, o que pode apontar, ainda que os sinais apresentados sejam ambíguos, para um processo de consolidação da SPN como campo de pesquisa.
A pesquisa mostrou também que, por um lado, há um gradativo crescimento no número total da produção científica e no número de artigos acadêmicos sobre a SPN publicados até o atual momento. Por outro lado, também constatou-se uma queda no número de dissertações e teses a partir de 2017 e 2018, respectivamente. A depender da evolução dessas produções nos próximos anos pode haver maiores avanços ou retrocessos na área.
Pesquisas da Çarê-IEPS
Paper para o 13º Congresso da ABRASCO
O levantamento da produção científica e acadêmica sobre a SPN resultou na produção de um paper para o 13º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva da ABRASCO, na categoria de “Relato de Pesquisa” e no eixo temático “Interseccionalidades, lutas sociais e direitos humanos na saúde”.
Nota Técnica n. 27: “Desigualdades raciais na saúde: cuidados pré-natais e mortalidade materna no Brasil, 2014-2020”
Publicada em agosto de 2022, a pesquisa aponta que o número de mulheres negras que morreram durante a gravidez ou 42 dias após o fim da gestação foi de 8 a mais, a cada 100 mil nascidos vivos, do que entre mulheres brancas no período de 2014 a 2019. O estudo também identificou que os índices de pré-natal adequado são piores entre as mulheres negras. No primeiro ano da pandemia de Covid-19, o número de gestantes que realizaram o pré-natal de forma adequada caiu 1,44% entre mulheres negras, enquanto a queda foi de 0,54% entre mulheres brancas.
Os dados foram coletados e analisados por Rony Coelho, Matías Mrejen, Jéssica Remédios e Gisele Campos, pesquisadores do IEPS.
Boletim Çarê-IEPS n. 1/2022 Saúde Materna da Mulher Negra
Gestantes e puérperas pretas têm os piores indicadores de mortalidade materna, entre as causas mais frequentes de óbito, apontou o primeiro Boletim Çarê-IEPS, publicado em novembro de 2022. O estudo analisou as causas de mortalidade materna a partir da 10ª Classificação Estatística Internacional de Doenças (CID-10) entre 2014 e 2021. Nesse período, na categoria “Afecções obstétricas não classificadas em outra parte”, que reúne diversas causas de mortalidade, como transtornos mentais e doenças virais, a média da razão de mortalidade materna entre mulheres pretas foi de 42,9, mais que o dobro do que mulheres brancas (20,8) e pardas (20,1).
Boletim Çarê-IEPS n. 2/2022 Mortalidade e Acidentes de Motocicletas por recorte racial
Pessoas negras são as principais vítimas fatais de acidentes de motocicleta, revelou o Boletim Çarê-IEPS n. 2 de Saúde da População Negra, publicado em março de 2023. O estudo aponta que no comparativo entre janeiro de 2016 e janeiro de 2021, a taxa de mortes entre pessoas negras cresceu de 0,06 a cada 100 mil habitantes (aproximadamente 75 mortes mensais) para 0,08 (aproximadamente 102 mortes mensais). No caso de pessoas brancas a taxa mensal permaneceu 0,05 a cada 100 mil habitantes, o que representa uma variação de aproximadamente 48 mortes para 55.
Saúde da População Negra na mídia
Além da produção científica, um dos objetivos da cátedra é dar visibilidade para os temas da SPN. Antes mesmo da consolidação da cátedra, o IEPS, com a colaboração de pesquisadores parceiros, iniciou a publicação de artigos de opinião sobre a SPN no blog Saúde em Público, da Folha de S. Paulo. Em 2022, a cátedra deu continuidade às publicações e teve os resultados da nota técnica n. 27 repercutidos pela imprensa especializada.
Saúde em Público
- Os riscos de ser negro no Brasil e o racismo que mata
- Panorama atual e desafios da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra
- Orçamento público para a saúde da população negra: uma tarefa por fazer
- Implantação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra no município do Rio de Janeiro
- Enfermagem brasileira e pertencimento étnico-racial: o que sabemos, e o que precisamos saber?
- Abolição inconclusa e a ausência de saúde da população negra no Brasil
- Saúde da população negra importa
- Ocupar o 13 de maio, para abolir as desigualdades raciais na saúde
Nota Técnica n. 27: repercussão na imprensa
- Mulheres negras tiveram menos acesso ao pré-natal e maiores índices de mortalidade materna entre 2014 e 2020 – Mundo Negro
- Apenas 6 em cada 10 mulheres negras têm acesso ao pré-natal – Alma Preta Jornalismo

- Apenas 6 em cada 10 mulheres negras têm acesso ao pré-natal – Terra
- Desigualdade racial: mulheres negras têm piores indicadores de acesso ao pré-natal no Brasil – Agência Amazônia
- Desigualdade racial: mulheres negras têm piores indicadores de acesso ao pré-natal no Brasil – TV Cultura
Diálogos IEPS #5 – Pandemia, participação social e políticas para a saúde da população negra no Brasil
O Diálogos IEPS #5 debateu as desigualdades sociais e raciais no acesso à saúde pública e de qualidade. Para a maioria da população negra no Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) é a única alternativa de suporte médico, no entanto, lacunas de atendimento ainda impedem que o serviço seja equânime e de qualidade. O resultado é uma mortalidade maior entre negros, em comparação aos brancos no País, e exacerbada pela pandemia de Covid-19.