Condições de Vida e Saúde: último diagnóstico da Agenda Mais SUS já está disponível para download

Desemprego, violência, estagnação na renda média das famílias e baixa escolaridade são alguns aspectos que impactam diretamente a saúde da população brasileira. Esses fatores são considerados importantes Determinantes Sociais da Saúde (DSS) e é sobre esse tema que o quarto e último diagnóstico da Agenda Mais SUS, uma iniciativa do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e da Umane, se debruça, reunindo e analisando os dados mais recentes dos DSS e seus impactos na saúde das populações em vulnerabilidade social, como a negra, a indígena, a LGBTQIAPN+ e a quilombola.

Segundo Julia Pereira, analista de relações institucionais do IEPS e uma das autoras da pesquisa, a análise dos DSS reforçam a perspectiva sobre a integralidade e a equidade na saúde, princípios do Sistema Único de Saúde (SUS) que colocam em destaque, respectivamente, a valorização da percepção sobre os indivíduos em sua totalidade e o papel do Estado em assegurar o acesso universal e igualitários aos serviços de saúde.

“É fundamental que esses princípios orientem efetivamente as políticas de saúde em um país tão desigual como o Brasil. A partir deles, busca-se reconhecer as diferenças nas condições de vida e saúde, bem como as demandas de cada pessoa e grupos sociais para que o SUS possa atender à diversidade do país. O que está em debate é a interação das pessoas com os diversos fatores da vida em sociedade e como eles, por outro lado, influenciam diretamente a saúde e o bem-estar de cada um. As políticas de saúde devem considerar essa complexidade da realidade social”, enfatiza a pesquisadora. 

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O Diagnóstico n. 4 é o último da coletânea “Mais SUS em Evidências”, uma produção da Agenda Mais SUS.

O Diagnóstico analisou dados relativos às condições de vida e saúde da população negra; das populações do campo, da floresta e das águas (PCFAs) e Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs); da população LGBTQIAPN+; e da população com deficiência. Também foram apresentados dados sobre os impactos da pandemia de Covid-19 nos DSS analisados na pesquisa.

População Negra

A população negra (autodeclarados pretos ou pardos) representa mais da metade da população brasileira (50,7%), como já indicavam os dados do Censo de 2010 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E essa parcela expressiva da população é impactada por um dos principais DSS: o racismo. As desigualdades raciais impactam as condições educacionais, econômicas e a segurança de pessoas negras e influenciam de forma contundente as condições de vida e saúde dessa população. 

O Diagnóstico n. 4 aponta os desafios e apresenta recomendações para aprimorar as políticas de saúde para a população negra no Brasil. Além da necessidade de implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN), o estudo enfatiza a importância da priorização orçamentária para ações de promoção de equidade em saúde e a coleta de dados do quesito raça/cor para a construção de políticas públicas baseadas em dados e evidências.  

Populações do campo, da floresta e das águas (PCFAs) e Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs)

A população do campo, da floresta e das águas é extremamente diversa.  O grupo reúne  camponeses, indígenas, quilombolas, ciganos/romani, ribeirinhos, agricultores familiares, extrativistas, população atingida por barragens, trabalhadores rurais assentados ou acampados, assalariados e temporários que residam ou não no campo. O trabalho rural e informal são fatores transversais a esses diferentes grupos e fundamentais para entender as vulnerabilidades de saúde dessa população.

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Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Segundo o Diagnóstico n. 4 da Agenda Mais SUS, a questão orçamentária é um ponto que exige atenção do poder público. A população indígena é a única que possui orçamento exclusivo e, no entanto, o orçamento tem sofrido queda expressiva nos últimos anos. Os recursos para as demais populações estão distribuídos no orçamento comum da saúde e carecem de ações específicas. 

A ausência de dados e indicadores de saúde sobre essa população também é um desafio a ser enfrentado pelo poder público. Segundo o Diagnóstico, é necessário que as bases de dados permitam a identificação dos povos de comunidades tradicionais para que o planejamento e monitoramento de políticas públicas sejam possíveis. 

Além disso, o avanço de projetos de grande impacto ambiental e a dificuldade de fixação de profissionais de saúde em regiões distantes dos centros urbanos também impõe desafios para o acesso à saúde. O Diagnóstico aponta ainda a falta de reconhecimento dos saberes e práticas tradicionais como fator que inviabiliza o vínculo e o diálogo entre as populações do campo e os serviços do SUS.

População LGBTQIAPN+

Um dos principais desafios da população LGBTQIAPN+ no acesso à saúde é a discriminação e a falta de preparo dos profissionais. Condutas inadequadas, conotações preconceituosas e estigmatizantes, atendimentos não humanizados, ausência de acolhimento, negligência de ações e omissão de cuidado ainda marcam o atendimento a essa população nos serviços de saúde. 

O Diagnóstico destacou a LGBTfobia institucional, a despriorização orçamentária e a limitação do debate sobre saúde LGBTQIAPN+  aos temas  ligados a infecções sexualmente transmissíveis como os principais desafios a serem enfrentados para garantir acesso à saúde à essa população. O documento reforça ainda a importância do desenvolvimento de linhas de cuidado para pessoas trans e a descentralização dos serviços de atendimento a essa população para que haja maior facilidade de acesso aos serviços,  como a hormonioterapia, que precisarão ser realizados por toda a vida e de forma regular por pessoas trans. 

População com deficiência

Segundo dados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019 apresentados no Diagnóstico n. 4, 17,3 milhões de brasileiros com 2 ou mais anos de idade possuem algum grau de deficiência, o que representa 8,4% da população. Apesar disso, o sistema de saúde ainda carece de ações eficientes para atender as demandas de saúde dessa população, que enfrenta altos índices de desemprego e desigualdades salariais em relação às pessoas sem deficiência. 

Outro desafio destacado pela pesquisa é a baixa cobertura dos planos de saúde em relação às PCDs. Apesar da Lei nº 9.656/1998 determinar que ninguém pode ser impedido de participar de planos privados de  saúde em razão da idade ou da condição de PCD, os relatos de cobranças de taxas extras e dificuldades de acesso são recorrentes. A prática é ilegal.

A pandemia de Covid-19 e  os DSS

A pandemia de Covid-19 impactou profundamente toda sociedade brasileira e, mesmo após o fim da emergência sanitária, a doença segue impactando a população. Seja pelos casos que ainda existem e podem ser fatais  (dados de 2023 da Organização Mundial da Saúde indicam que a Covid mata uma pessoa a cada três minutos), seja pelos efeitos da “Covid longa”. 

Os impactos foram mais graves para algumas parcelas da sociedade e a análise dessas desigualdades precisa considerar os DSS como fator fundamental. Segundo dados do Diagnóstico n. 4, nos estados brasileiros, 59,8% da variação da incidência de Covid-19 foi justificada pela desigualdade de renda, maior adensamento domiciliar e maior letalidade. No caso da mortalidade, essas mesmas variáveis explicaram 57,9% das variações encontradas nas Unidades Federativas do país. 

Pessoas pretas e pardas com Covid-19, por exemplo, tiveram pelo menos 43% e 32% mais chances de morrer, respectivamente, em comparação com a população branca. Já o aumento do desmatamento esteve associado à incidência de Covid-19 entre os indígenas. Segundo dados do Diagnóstico, um km² desmatado resultava, em 2020, em 9,5% a mais de casos novos de Covid-19 em duas semanas.

Acesse o caderno de propostas e a coletânea Mais SUS em Evidências aqui