Dados sobre raça/cor no DataSUS cresceram, mas registros são desiguais, aponta pesquisa Çarê-IEPS
Foto: Paula Fróes/Governo da Bahia
Foto: Paula Fróes/Governo da Bahia
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O preenchimento de dados sobre raça/cor no DataSUS cresceu ao longo dos anos, mas essa expansão ocorreu de forma heterogênea entre os principais bancos de dados do sistema de saúde. É o que revela a Nota Técnica n. 30 “O Quesito Raça/Cor no DataSUS: evolução e determinantes da completude”, elaborada pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde em parceria com o Instituto Çarê. O estudo faz parte das produções da cátedra Çarê-IEPS, que produz pesquisas sobre a saúde da população negra no Brasil. Dados dos Sistemas de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC) e Mortalidade (SIM) apresentam completude bastante elevada, enquanto os Sistemas de Informações Hospitalares (SIH) e Ambulatoriais (SIA) necessitam de melhorias. 

Os dados das estatísticas vitais (SIM e SINASC) apresentaram, em média, 97% de completude no quinquênio encerrado em 2020. Já nos dados de hospitalização (SIH), a média foi de 76% e nos ambulatoriais (SIA), de 52%.

Dados sobre raça/cor no DataSUS cresceram, mas registros são desiguais, aponta pesquisa Çarê-IEPS
Fonte: Elaboração dos autores a partir de microdados do DataSUS

O preenchimento do quesito raça/cor se tornou obrigatório nos Sistemas de Informação de Saúde (SIS) em 2017, mas apesar da obrigatoriedade, ainda consta nos registros o campo “sem informação”, o que dá margem para uma grande quantidade de dados incompletos. Apenas mais recentemente, na última reunião ordinária da Comissão Intergestores Tripartite, realizada em março de 2023, definiram-se esforços coordenados para que não seja permitido o cadastro de novos usuários do SUS utilizando o domínio 99 (“sem informação”). 

Para Rony Coelho, pesquisador do IEPS e um dos autores do estudo,  a melhoria da qualidade dos registros de raça/cor no DataSUS é essencial para avaliar as desigualdades raciais em saúde e para melhor focalização das ações da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN).

“O registro do quesito raça/cor é fundamental para que o poder público possa desenhar e implementar políticas baseada em dados e evidências científicas. Esse é um passo elementar para construção de políticas transversais que possibilitem melhorias nas condições de saúde da população negra e reduzam as desigualdades raciais na saúde. Tornar as desigualdades visíveis é o primeiro passo para reduzi-las”, explica o pesquisador. 

Fatores socioeconômicos influenciam os níveis de completude dos Sistemas de Informação

O estudo conclui também que fatores socioeconômicos das localidades influenciam no preenchimento dos dados sobre raça/cor. Municípios com maiores níveis no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB, 9º ano) estão associados à maior completude do quesito raça/cor no SINASC, SIM e no SIA, enquanto municípios com maiores níveis de gasto per capita com o Programa Bolsa Família (PBF) estão associados a maiores níveis de completude no SINASC e no SIH. 

Dados sobre raça/cor no DataSUS cresceram, mas registros são desiguais, aponta pesquisa Çarê-IEPS
Fonte: Elaboração dos autores a partir dos microdados do DataSUS

Em contraste, o maior número de profissionais da saúde (exceto médicos), em relação à população, apresentou correlação negativa com a completude do quesito raça/cor. Esse resultado pode sugerir que maior disponibilidade de recursos humanos em saúde não é garantia de melhor preenchimento dos dados. Como preconiza a PNSIPN, é essencial investir no treinamento desses profissionais para o apropriado preenchimento do quesito raça/cor.

Outros fatores que influenciam a completude dos dados no SIH e no SIA

A análise dos Sistemas de Informações Hospitalares (SIH) indica que  hospitalizações em estabelecimentos municipais têm maiores probabilidades de apresentarem dados incompletos sobre raça/cor em relação aos  estabelecimentos federais, estaduais e privados. 

A complexidade do atendimento também é um fator preponderante para nível de completude no preenchimento do quesito raça/cor. Quanto maior o nível de complexidade, melhor a qualidade do preenchimento. Isto pode estar relacionado a um maior cuidado no registro dos dados em procedimentos mais complexos ou ao fato desses atendimentos serem realizados em estabelecimentos com trabalhadores mais capacitados e/ou melhor infraestrutura. 

Na análise dos Sistemas de Informações Ambulatoriais (SIA)  atendimentos com ausência de preenchimento de outras variáveis (por exemplo, sexo) têm maiores probabilidades de ter o quesito raça/cor também incompleto. Isto ressalta que os níveis ruins de completude do quesito raça/cor estão relacionados à existência de muitas observações com preenchimento deficiente dos dados de forma geral.  Nesse caso, há necessidade de uma melhora geral na qualidade do registro de informações no SIA, para garantir a aplicação e efetividade da Portaria nº 344/2017.